Com pouco mais de dois meses de governo, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ainda não concluiu as negociações com partidos para consolidar a sua base de apoio no Congresso Nacional. Desde a volta do petismo ao poder, o governo busca se aproximar de legendas com alta representatividade e que possam lhe entregar votos em pautas consideradas importantes tanto na Câmara dos Deputados quanto no Senado Federal. Apesar dos esforços do Palácio do Planalto em estreitar relações com siglas que não estiveram com Lula na campanha eleitoral, os articuladores da gestão precisam, inicialmente, resolver um problema caseiro, que envolve o União Brasil, agraciado com três ministérios: Comunicações, Turismo e Integração Nacional. Apesar dos postos de primeiro escalão cedidos, uma ala do partido não tem demonstrado intenção de votar com o governo. Mais do que isso, dois dos ministros da legenda tiveram seus nomes envolvidos em denúncias, o que aumentou a pressão por eventuais demissões e criou uma dor de cabeça para o presidente da República, que decidiu mantê-los na Esplanada. A decisão foi tomada depois que diversos interlocutores alertaram Lula do risco de rifar quadros do União no momento em que não há base sólida no Parlamento.
Fruto da fusão entre Democratas e PSL, o União Brasil já nasceu dividido. Desde o início da gestão Lula 3, o presidente nacional do partido, Luciano Bivar, se mostrou disposto a contribuir politicamente com o governo federal, apesar de cobrar, de forma pública ou nos bastidores, mais espaço na administração pública. Porém, caciques egressos do DEM, partido que historicamente esteve na oposição ao PT, não concordam com a aproximação e dizem preferir uma posição independente. Além disso, há outros três componentes que ajudam a explicar por que a relação do União com o governo é conturbada: primeiro, porque a sigla abriga nomes como o senador Sergio Moro (PR), ex-juiz da Lava Jato, responsável por condenar Lula; em segundo lugar, porque quase a metade dos 59 deputados da legenda assinou o requerimento que pede a abertura de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para investigar os atos de vandalismo do dia 8 de janeiro. O chefe do Executivo federal, vale dizer, é contra a instalação do colegiado, por acreditar que isso atrapalhará votações no Congresso e por considerar que o Judiciário já está investigando o episódio de invasão; por fim, pois quadros influentes do partido, como o líder na Câmara, Elmar Nascimento (BA), disse, em mais de uma ocasião, que os nomes escolhidos por Lula para os ministérios não representavam os anseios da bancada.
Apesar disso, na última semana, Elmar e o líder do União no Senado, Efraim Filho (PB), divulgaram uma nota reagindo às declarações da presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, que havia cobrado o afastamento do ministro das Comunicações, Juscelino Filho, do cargo, para evitar “constrangimento de parte a parte”. Filho é acusado de ter utilizado indevidamente recursos públicos como diárias e passagens oficiais em voos da Força Aérea Brasileira (FAB) em viagens ao Maranhão e a São Paulo – ele nega as acusações. Os correligionários, então, afirmaram que a petista utilizava “dois pesos e duas medidas para tratar de assuntos inerentes à vida pública”. “Quando atitudes dos seus aliados são contestadas –e não faltaram acusações a membros do PT na história recente do país –a parlamentar prega o direito de defesa. Quando a situação se inverte, prefere fazer pré-julgamentos”, escrevem em nota divulgada à imprensa, em mais um episódio que estremeceu a relação entre o Planalto e uma ala do partido de Bivar. A decisão de Lula de manter Juscelino e, por tabela, prestigiar o União Brasil, foi bem vista por membros do partido. Para Junior Bozzella (SP), ex-deputado federal e vice-presidente da sigla, o gesto do presidente da República deve ser um facilitador para futuras negociações.
Para o dirigente, a convergência entre o União e a base governista não acontecerá “do dia para a noite”, mas a manutenção de Daniela Carneiro e Juscelino Filho pode ser visto como um passo dado pelo governo para dialogar com o partido. Questionado sobre a suposta independência do partido, Bozella pontuou que o posicionamento neutro é “relativo” e que pressupõe determinadas atitudes. “Um partido que tem independência não pode flertar nem para um lado e nem para o outro, nem com a direita e nem com a esquerda”, disse. “As futuras tratativas, as próximas conversas, dialogando com as forças do partido, acho que a tendência é que [o União Brasil] esteja mais próximo do governo”, disse. O deputado federal Danilo Forte (União Brasil-CE), por outro lado, é um dos defensores da ideia de a sigla se manter neutra em relação ao governo federal.
O líder do União no Senado, Efraim Filho, diz que o gesto de Lula de manter o nome de Juscelino à frente das Comunicações “é bem-vindo” e pavimenta o caminho para um “canal de diálogo”. Na avaliação do parlamentar, ao pedir para o ministro se afastar do cargo e dizer que o União não entregaria votos ao governo, Gleisi cometeu um “equívoco”. “Na PEC da Transição, a única matéria relevante do governo, o União teve uma posição decisiva no resultado final. A conta é simples, o painel de votação é público. Basta retirar os votos do União Brasil que a PEC seria rejeitada. O governo teria sido derrotado”, disse ao site da Jovem Pan. Segundo Efraim, a postura de independência dá liberdade aos políticos que buscam compor com a base governista e também respeita aqueles que foram eleitos através de um sentimento de oposição ao governo federal. Sobre o futuro da relação entre União Brasil e Palácio do Planalto, o líder da bancada na Casa Alta do Legislativo afirmou que tende a permanecer com um diálogo aberto. “Esse é o caminho que esperamos que seja fluido”, finalizou.
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