Se a derrota do Brasil na Copa do Mundo, que enxugou a liquidez dos negócios, não era esperada, a indicação de Fernando Haddad para o Ministério da Fazenda não foi necessariamente uma surpresa. Mesmo assim, a reação dos ativos brasileiros foi diversa. Enquanto a Bolsa absorveu o nome e sustentou ganhos de 0,25% com a ajuda das ações ligadas a commodities metálicas, dólar e juros futuros reagiram de forma negativa, também influenciados pelo comportamento de pares no exterior.
Lá fora, pesaram a queda das commodities e os sinais ruins da inflação nos Estados Unidos, que adicionam mais incerteza à decisão do Federal Reserve de quarta-feira que vem. O avanço acima do previsto da inflação atacadista nos EUA reforçou o sentimento de que o Federal Reserve pode até reduzir o ritmo de aperto na próxima semana, mas que a alta de juros na maior economia do mundo ainda deve continuar por algum tempo. Tal fato, além de responder pelo fechamento negativo nas Bolsas americanas, puxou os rendimentos dos Treasuries e o dólar ante quase todas as demais divisas.
Com tudo isso no horizonte, a confirmação do nome do ex-prefeito de São Paulo para comandar a economia do País foi apenas a cereja do bolo a reforçar a desconfiança do investidor com a política fiscal do próximo governo. Assim, houve novo acréscimo de prêmios nos vencimentos longos da curva a termo de juros, tanto nesta sexta-feira, 9, quanto na semana, enquanto as taxas curtas exibiram lateralidade, em dia de IPCA no piso das estimativas.
No câmbio, o ambiente de incertezas proporcionou valorização da moeda americana ante o real tanto neste pregão quanto na semana, de 0,57% e de 0,59%, respectivamente, a R$ 5,2456. Nada disso, contudo, impediu o avanço de 0,25% do Ibovespa, aos 107.519,56 pontos, reduzindo a perda semanal a 3,94%. A força dos papéis de Vale e siderúrgicas, animados pelos sucessivos alívios nas políticas anticovid da China, respondeu por boa parte dos ganhos desta sexta-feira.
As preocupações do mercado financeiro, principalmente de investidores domésticos, com Fernando Haddad são "exageradas" e a Faria Lima está "superestimando os riscos" da atuação dele no ministério da Fazenda, avalia a consultoria inglesa TS Lombard. "Acreditamos que esse medo é exagerado e o mercado está avaliando mal os riscos, o que pode levar a oportunidades de compra no futuro", comentam os analistas da TS, Elizabeth Johnson e Wilson Ferrarezi, em relatório.
"O mercado é pragmático e gosta daqueles que têm identificação consigo, mas não necessariamente o ministro precisa ser o técnico, pelo contrário. Pode ter perfil mais político, como é o caso agora, alguém em que o Lula confia e que possa ter um relacionamento mais fácil com as bancadas, com os políticos. Mais do que a figura do Haddad, precisamos entender ainda qual será o plano de governo", diz Rodrigo Marcatti, economista e CEO da Veedha Investimentos, acrescentando que, com o tempo, será preciso afastar qualquer impressão de que o novo governo Lula penda para uma continuação da última passagem do PT pelo poder, com Dilma Rousseff.
"Haddad na economia já era um nome mais do que certo, é preciso aguardar agora qual será sua equipe econômica. A gestão dele na prefeitura de São Paulo mostrou cuidado com o lado fiscal. Obviamente, o governo não terá apenas gastos, mas também receitas para cobrir esses gastos. A tendência é por aumento de impostos e retirada, em certos casos, de subsídios, o que não é tão fácil de passar pelo Congresso como ampliar os gastos", observa Piter Carvalho, economista da Valor Investimentos.
"Embora o Haddad já estivesse no radar de que seria o escolhido para a Fazenda, o mercado preferiria alguém com perfil um pouco mais técnico. Quando houve a confirmação do nome, o dólar estressou um pouco, mas depois se acomodou, subindo menos. A incerteza com relação a isso foi superada, com a definição de quem será o próximo ministro", diz Cristiane Quartaroli, economista do Banco Ourinvest.
Comments