O papa Francisco desembarcou nesta quarta-feira, 2, em Lisboa, Portugal, para a Jornada Mundial da Juventude (JMJ). Espera-se que cerca de um milhão de peregrinos de todo o mundo participem. Cerca de 16 mil profissionais de segurança, proteção civil e emergência médica foram mobilizados para o evento. O pontífice chegou por volta das 9h45 (5h45 em Brasília) no aeroporto militar de Lisboa. Durante o voo, Jorge Bergoglio afirmou, em resposta aos jornalistas que o relembraram de sua passagem pelo Rio de Janeiro em 2013, que vai “continuar fazendo bagunça”. “Dez anos se passaram desde aquele ‘Façam bagunça’”, recordou um jornalista durante o voo, ao que o pontífice respondeu: “E continuaremos fazendo bagunça”. Ao som de seus tambores e entoando canções como “Esta é a juventude do papa”, centenas de peregrinos esperavam desde o início da manhã para receber um pontífice muito popular entre os jovens fiéis. Antes de seu primeiro encontro com os jovens, na quinta-feira,3, a agenda de Francisco está dedicada às autoridades e ao clero do país. Em Portugal, cerca de 80% dos 10 milhões de habitantes se definem como católicos. Durante seu primeiro discurso às autoridades e corpo diplomático no centro cultural de Belém, Francisco falou sobre a guerra na Ucrânia e lamentou a falta de ‘rotas corajosas’ para pôr fim ao conflito que se encaminha para o segundo ano.
“Olhando com grande afeto para a Europa, no espírito de diálogo que a carateriza, apetece perguntar-lhe: para onde navegas, se não ofereces percursos de paz, vias inovadoras para acabar com a guerra na Ucrânia e com tantos conflitos que ensanguentam o mundo?”, questionou. “No oceano da história, estamos a navegar num momento tempestuoso e sente-se a falta de rotas corajosas de paz”, lamentou o jesuíta argentino, que pediu repetidamente pela paz na Ucrânia desde o início da invasão russa em fevereiro de 2022.
Aos 86 anos, Francisco, que contou com ajuda de uma bengala durante o voo e saiu do avião em uma cadeira de rodas, estava bem disposto e quis, como é tradição, cumprimentar um a um os cerca de 80 repórteres de todo o mundo que o acompanharam no percurso de Roma para Lisboa. O papa declarou que, apesar do calendário apertado e intenso, regressará “rejuvenescido” deste evento, o maior organizado pela Igreja Católica e que acontece de três em três anos, mas que teve de ser adiado por um ano devido à pandemia. Apesar de ter sido operado de uma hérnia abdominal há dois meses, Francisco não quis faltar ao encontro, que será a quarta JMJ da qual participará, depois das do Brasil, Polônia e Panamá. Segundo explicou aos jornalistas, embora os organizadores tenham falado que cerca de um milhão de jovens vão participar na JMJ de Lisboa, existe a expectativa de que esse número seja ultrapassado. “Eles me disseram que haverá mais de um milhão”, disse Francisco, que aproveitou também para agradecer aos jornalistas pelo trabalho dos últimos dias.
Em Lisboa, onde foram construídos ritos fundamentais para o caminho da comunidade europeia, Francisco recordou “o sonho europeu de um multilateralismo mais amplo do que o mero contexto ocidental”, capaz de “captar o mais débil sinal de distensão e de o ler por entre as linhas mais tortas da realidade”. “O mundo tem necessidade da Europa, da Europa verdadeira: precisa do seu papel de construtora de pontes e de pacificadora no Leste europeu, no Mediterrâneo, na África e no Médio Oriente”, destacou. Fiel aos temas principais de seu pontificado iniciado em 2013, o papa criticou os flagelos que enfraquecem, segundo ele, o Ocidente, como as políticas de imigração, a crise demográfica, a eutanásia e o comércio de armas. Portugal aprovou em maio uma lei que regula “a morte assistida”, unindo-se ao grupo de países europeus que legalizaram a eutanásia e o suicídio assistido, como os da Benelux e a vizinha Espanha.
Francisco é o quarto papa a visitar Portugal, onde já esteve em 2017. Ele pode aproveitar a JMJ para abordar a delicada questão dos abusos sexuais de menores de idade na Igreja, seis meses após a publicação de um relatório impactante de uma comissão de especialistas independentes. De acordo com a Conferência Episcopal e a direção do comitê organizador local da JMJ, o papa deve se reunir em caráter privado com vítimas dos abusos, mas o encontro não aparece em sua agenda oficial. Considerada a maior reunião internacional de católicos, a JMJ foi criada em 1986 por iniciativa do papa João Paulo II.
Manifestações contra os abusos de menores
Se por um lado milhões de pessoas são esperadas para a JMJ, também há aqueles que estão se manifestando contra os casos de abusos contra menores cometidos na Igreja Católica portuguesa. Estima-se que existam ao menos 4.800 vítimas, segundo uma investigação independente. Nesta quarta, Lisboa amanheceu com grandes cartazes espalhados por três bairros: Loures, Algés e Alameda. Eles são resultado de uma campanha de angariação de fundos no âmbito do projeto batizado como “This is our memorial” (“Este é o nosso memorial”). O site do projeto denuncia o “silêncio ensurdecedor” da Igreja e resgata o relatório publicado no último mês de fevereiro.
O grupo, cujo nome é uma crítica direta à proposta da Igreja de criar um “memorial” em homenagem às vítimas, se identifica como um grupo de cidadãos de “diversos credos” que “não querem que os abusos sejam esquecidos”. Em seu site, eles destacam que “nada pode corrigir ou reparar a vida destas mais de 4.800 vítimas”. “O que podemos e devemos fazer é lembrar deles. Dar-lhes voz. Para que o que aconteceu não volte a acontecer.” Nos últimos dias, pequenos cartazes espalhados pela cidade denunciaram a violência sexual dentro da Igreja e questionaram a celebração da JMJ em Lisboa. As vítimas de abusos em Portugal denunciaram que o assunto não está no programa oficial da visita do papa.
*Com agências internacionais
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